quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

"Este livro foi-se escrevendo a ele próprio"

Entrevista a Beatriz Gil - autora do livro “Gente com Gente dentro” [Alfarroba]



      Boa tarde meninas e meninos hoje, trago-vos a entrevista que o blogue "A leitura é um Oásis" realizou a Beatriz Gil -  autora do livro  "Gente com Gente dentro".
       Espero que vocês apreciem esta entrevista tal como eu :)

Entrevista:


1-      Descreve-nos um pouco sobre ti, isto é, como és e do que mais gostas de fazer.
Revejo-me no ser humano enquanto conceito abstrato, ou seja, aquilo que ele de facto é quando ninguém está a olhar, em oposição ao concreto, àquilo que ainda vamos tendo uma necessidade que roça o ridículo de nos fazermos passar por uma qualquer coisa que esperamos ser aquela que gostavam que fôssemos. Gosto de me ver como uma espécie de silêncio ensurdecedor, em ebulição, sempre com um pé virado para o caos e o outro no doce que é a ausência total de ruído. Espírito em polvorosa, se assim me fizer melhor entender. O que gosto de fazer… claro que escrever terá de passar por aquilo que, apesar de nem sempre gostar por me fazer sofrer (dependendo dos temas), mais faço e mais prazer me dá. Além disso, exatamente o mesmo que tantas outras pessoas, a música preenche uma boa parte do meu tempo. A música, o cinema e a leitura. No final do dia aquilo que mais gosto de fazer talvez seja mesmo observar esta coisa toda que é a vida e amá-la imensamente por todas as falhas, cicatrizes e socalcos que nos vai colocando no caminho, sabendo ela própria, a vida, que somos apenas humanos, e que volta e meia nos é permitido deixá-la a descansar à sombra de um chaparro.

2- Este é o teu primeiro livro?
Não, o meu primeiro livro é o “Punhos Cerrados”, editado pela Chiado Editora. Um livro que essencialmente fala sobre a perda, num tom distinto deste novo “Gente com gente dentro”, que retrata pequenas histórias, enquanto que o “Punhos Cerrados” tem uma narrativa contínua, em forma de novela.

3- Conta-nos como foi escrever este livro?
Este livro foi-se escrevendo a ele próprio. É o resultado de cerca de um ano de contos e crónicas escritos ao sabor das horas e dos meses. É um livro imensamente meu, dentro contém muito daquilo que eu sou no meu mais profundo íntimo, daquilo que vejo, daquilo que sinto, daquilo que eu julgava ser a vida e daquilo que ela afinal de contas é, vista através dos meus olhos.

4- Como é que surgiu esta narrativa?
Como referi na resposta anterior, este livro é o produto de várias noites de insónia e de vários dias ora cinzentos, ora encandeados pela mais ofuscante luz. Falar sobre as pessoas, que eu tanto amo, sobre aquilo que, correndo sérios riscos de me enganar redondamente, adivinho serem as suas vidas. Além deste prisma, o dos outros que me saem de dentro, está cheio de pequenos contos que são inteiramente a minha própria vida. Vários contos aliás falam sobre pessoas que, de uma forma ou outra, me foram importantes, tão importantes que a urgência em escrever sobre elas foi tão violenta que aí estão, despidas de um pudor que não sei se reconhecem ou sequer querem, mas que é aquilo que me fazem sentir, todas as palavras e emoções que me ensinaram, sem floreados ou pretensões de agradar a um grego, sendo eu troiana.

5- Que conselho dás às pessoas que tal como tu querem ver o seu trabalho publicado?
As minhas andanças por estes meandros que são a escrita editada e publicada são reduzidas, apesar de valorizadas, e por isso tenho a agradecer aos que me leem e constantemente me contactam com críticas, comentários ou simples palavras de apreço. Apesar deste meu curto trajeto, julgo ter já algum material em mãos para poder afirmar que o processo de publicar um livro deve ser levado a sério, desde a escolha da editora, à revisão do trabalho a ser publicado, que deve ser o espelho daquilo que realmente querem dizer. Ou seja, devem ser meticulosos com o vosso trabalho, não caírem na precipitação, que julgo acontecer tantas vezes, de quererem publicar o mais rápido possível, a qualquer custo e cedência. Acima de tudo, respeitem o vosso trabalho e certifiquem-se de que quem o vai levar ao mundo também o respeita, tanto quanto vocês. E é neste ponto que a Alfarroba foi a chave, a alavanca para que de repente o “Gente com gente dentro” ganhasse vida, e que essa vida tenha sido (e seja) altamente respeitada, valorizada e tratada com um profissionalismo e carinho incríveis.

6- Que projectos na escrita tens para o futuro?
De momento estou a trabalhar no segundo romance, que vai crescendo sempre mais um pouco e devagar vai ganhando a forma que pretendo que tenha. Tem o título provisório (que pode bem vir a ser o definitivo) de “Memória Descritiva”, posso apenas adiantar que se trata de uma história em que duas gerações colidem e quando isto acontece, já se sabe, o universo para o que pode acontecer é infinito. Além deste romance continuo a escrever crónicas e contos no meu blog, que tem o mesmo nome do livro “Gente com gente dentro” (http://bgil-gcgd.blogspot.pt/), que gostava que pudessem um dia vir a representar, quem sabe, um segundo volume do “Gente com gente dentro”, em formato físico.

7- O que é que acha do blogue A leitura é um Oásis?
Tenho pena que não existam mais blogues com esta estrutura, cuidada, interessada, atualizada e que acima de tudo valoriza aquilo que de novo e bom vai aparecendo. Como o vosso nome já o diz: é um oásis. Bom encontrar e saber que, afinal de contas, para nós escritores e para vós leitores nem tudo está perdido, que ainda vale a pena sangrar a alma para uma folha de papel e que ela, essa mesma folha de papel tingida com o sangue de quem a escreveu, vai ser acarinhada e compreendida por quem a lê, que por sua vez, a sangra também, à sua maneira, porque se revê e às tantas o escritor já não interessa nada, são os leitores que estão ali, a escrever a história por nós, a torná-la sua. E ainda bem que assim é!

Questões rápidas:
Livro: “Morreste-me”, de José Luís Peixoto (difícil escolher só um)
Autor: António Lobo Antunes (muitos outros nacionais e outros tantos estrangeiros)
Actriz/Actor: Marlon Brandon
Filme: A Lista de Schindler
Dia especial: 31 de Julho de 2008
Um desejo: que não me escape nunca entre os dedos a capacidade de escrever e de amar.

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